Olívia Orlandini

Gravar o primeiro áudio da minha casa foi engraçado e um pouco desconcertante, por isso eu e Kleber, meu namorado, que foi objeto de gravação, seguramos a risada durante a gravação toda e, no final, gargalhamos. Pensei em cortar, mas achei que ficou engraçado.

Todos os dias usamos o computador aqui em casa e o teclado mecânico é algo que sempre faz muito barulho, além disso, Kleber sempre usa o fone de ouvido muito alto, o que faz com que eu ouça, também, o que ele está ouvindo, achei que seria uma boa oportunidade captar tanto o teclado, como a música.

Achei interessante perceber o “delay” do latido dos cachorros em relação à buzina, como se eles esperassem o cessar dela para poderem latir e, ouvindo o áudio, consegui perceber a diferença de quando o cachorro latindo era do vizinho e quando eram os meus. Consegui captar os pássaros bem ao fundo, o que acho que representou bem o “cenário” que eu tenho do cômodo que estava gravando.

Já o segundo áudio foi menos desconcertante, mas seguramos as risadas em alguns momentos. Esse foi um pouco mais estressante, pois os meus bichos fazem esse “escândalo” do áudio toda vez que vamos colocar ração e um dos meus cachorros acabou bagunçando a ração, mas no fim deu tudo certo.

Me atentar em todos os barulhos que acontecem durante essa atividade me deixou com a mente um pouco sobrecarregada, porque geralmente eu tento ignorar a maioria dos sons que acontecem nessa hora do dia. Mas, ao mesmo tempo, esse foi um dos motivos que me fez escolher esse momento para gravar, pois é o momento de mais barulho na casa.

O choro do meu cachorro Poof é um das coisas que mais me chamou atenção para gravar, sempre acho muito chato esse som que ele faz, porque é muito agudo. O barulho feito quando pega a ração me passou uma sensação “crocante” e um pouco “áspera”.

Gostei de reparar ainda mais na diferença dos miados dos meus gatos e como a reação de todos muda, ficando mais intensa quando a ração é colocada nos potes.

No dia 11 de outubro, combinamos de ir juntas nos bairros tanto pela manhã, quanto pela tarde. Gravar de noite ficou meio complicado, como eu moro em outra cidade, não seria legal e nem justo Ana ir gravar de noite sozinha, mas acredito que o que captamos ficou legal.

O primeiro bairro que fomos foi o Morumbi, foi tranquilo de achar pelo GPS, mas o sol não deu descanso. Eu estava me sentindo tímida para gravar, mas queria achar um som diferente, algo sem ser só o movimento da rua.

Logo quando chegamos já ouvimos o som do martelo batendo em algo metálico. Percebi que os passarinhos pareciam conversar e, quando vi que um dos cantos que ouvi era de uma casa fui para frente para gravar.

Para mim foi muito triste, na verdade. Algum passarinho solto na natureza cantava e, logo depois, o que estava dentro da casa, na gaiola, respondia. Não pude evitar criar uma história especialmente melancólica na minha cabeça. Por um momento, quis pedir para o rapaz que estava martelando parar um pouco, para que eu pudesse gravar apenas aquele passarinho.

No mapa o bairro Pitanga não aparecia, então tivemos que pedir informação para o rapaz que estava dirigindo o caminhão de lixo, o qual foi muito gentil. Ele e o outro rapaz que estava recolhendo deram informações meio confusas, se eu estivesse sozinha, provavelmente, iria me perder, mas no final conseguimos achar o bairro.

Achei o bairro Pitanga mais legal, pois fazia mais sombra. Logo depois que Ana gravou o rio, o rapaz com o carrinho de mão chegou e saí correndo atrás dele. Como consegui gravar apenas 59 segundos resolvemos gravar um áudio a mais nesse bairro na parte da tarde. Mas fiquei satisfeita com esse som.

À tarde já sabíamos como chegar nos bairros mais facilmente, mas se não fosse a Ana, provavelmente eu teria me perdido, meu senso de localização é terrível. Amei o fato dos gatinhos estarem lá quando chegamos no bairro Morumbi. Depois fomos para a quadra que estava vazia, mas a estrutura estava meio que rangendo, no áudio acho que não ficou tão claro, mas ao menos conseguimos captar outras coisas.

No campinho, que é bem próximo da quadra, além do som de música e pessoas tinham uns cavalos, mas não consegui gravá-los. Fui me aproximando para tentar pegar algum som deles, um potrinho estava deitado e com um ponto com sangue na barriga, tentei chegar mais perto para ver o que tinha acontecido, mas a égua, que acredito ser a mãe, ficou um pouco chateada e virou o bumbum para mim, ensaiando um coice, então me afastei.

Fiquei me sentindo mal achando que ele estava machucado, ainda mais porque cavalos não costumam deitar, mas pesquisei na internet e o potrinho provavelmente tinha acabado de nascer, e o que achei ser um machucado era onde fica o umbigo/cordão umbilical. Isso me deixou feliz, mas, ainda sim, queria ter gravado algo deles.

O meu último áudio foi no bairro Pitanga, estávamos bem cansadas e suando horrores, pelo menos eu. Como só faltavam dois áudios para terminarmos decidimos virar numa rua que não tínhamos virado ainda.

Era uma pracinha e o barulho da serra era o som principal. Ao chegarmos mais perto para gravar, parei para prestar atenção no som da rádio vindo de uma caixa de som no poste.

Que sorte senti, pois quando comecei a gravar uma nota de falecimento começou a ser transmitida. Espero que não soe insensível, mas nada é mais interior do que nota de falecimento em rádio.

Ficamos muito cansadas, mas amei o resultado. Foi uma experiência divertida e fiquei tentada a, um dia, fazer um mapa sonoro da cidade que eu cresci, Conceição do Almeida, que chega a ser menor que Cachoeira, acho que seria uma experiência interessante.

Olívia Orlandini

(grupo Morumbi e Tororó)

Outubro, 2022.